Sociedades democráticas precisam compartilhar seus códigos
A idéia central dessa iniciativa é dispor de um ambiente colaborativo que não apenas reduza os custos dos governos, mas possibilite o aprimoramento dos aplicativos. Por Rogério Santanna.
Fonte: computerworld
O Portal do Software Público inaugura no Brasil um novo modelo de licenciamento e de gestão das soluções desenvolvidas no âmbito da União, estados e municípios. A idéia central dessa iniciativa é dispor de um ambiente colaborativo que não apenas reduza os custos dos governos, mas possibilite o aprimoramento dos aplicativos ali disponibilizados e, conseqüentemente, a melhoria do atendimento à população.Essa iniciativa atende a uma antiga reivindicação da comunidade brasileira de software livre que sempre reclamou do governo por não abrir os seus códigos e permitir o amplo acesso às soluções livres produzidas pela Administração. O portal foi lançado no 8º Fórum Internacional de Software Livre realizado em abril deste ano, em Porto Alegre.
A sociedade moderna está assentada em soluções e sistemas de computação cujo desempenho tem impacto decisivo na eficiência da ação governamental. Uma série de decisões amparadas na lei são traduzidas por sistemas de informação, então quanto mais os respectivos códigos estiverem abertos e passíveis de auditoria, maior a fiscalização da sociedade no mundo moderno.
Como nem sempre o código traduz exatamente o que lei apregoa, alguma injustiça pode ser cometida na implementação de determinada legislação. Por isso, o cidadão tem que poder acessar essas informações. Por exemplo, determinadas regras de decisão sobre o vencedor do edital licitatório, previstas na legislação, estão escritas em sistemas de informação. A classificação ou desclassificação de candidatos num vestibular também depende de sistemas de informação. A gestão e as decisões sobre benefícios sociais, como o Bolsa-Família, as regras de aposentadoria, o pagamento do imposto de renda, se a declaração do contribuinte será aceita ou irá para malha fina, quem receberá a restituição por primeiro, também passam por sistemas de informação.
O conceito de liberdade de utilização dos códigos que deve sustentar a sociedade moderna é central no Portal do Software Público Brasileiro. A administração pública do país incluindo União, estados e municípios precisava de um ambiente onde pudesse disponibilizar suas soluções já testadas e consagradas para evitar a sobreposição de custos com soluções já existentes, porém desconhecidas, e para que pudessem ser compartilhadas não apenas entre os órgãos de governo, mas também com a comunidade de usuários de software livre, empresas e pessoas físicas.
Uma das primeiras ferramentas disponibilizadas no Portal, o Configurador Automático e Coletor de Informações Computacionais (CACIC), é um grande exemplo de como uma solução pode ser melhorada quando compartilhada junto a uma comunidade de usuários e desenvolvedores. Os órgãos públicos sozinhos têm dificuldade em manter as ferramentas atualizadas por ser um processo complexo e oneroso. Mas abrir o código e possibilitar adoção dos softwares por muitos órgãos públicos e privados, como ocorreu com o Cacic, contribui para que seus códigos se mantenham atualizados e atinja um grau de aperfeiçoamento muito superior ao que cada um isoladamente poderia fazer.
O Cacic foi desenvolvido pela Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev) e disponibilizado como software livre à sociedade pela Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI) do Ministério do Planejamento. Atualmente a Comunidade Cacic tem mais de quatro mil membros e além de órgãos públicos, empresas, universidades, ONG’s do Brasil, países como Portugal, Equador, Argentina, Venezuela, Paraguai e Uruguai também utilizam a ferramenta.
Também podemos destacar a incorporação do Ginga ao Portal do Software Público que será oficializada no Congresso Anual da Sociedade Brasileira de Computação, no dia 3 de julho deste ano. O único desenvolvido em software livre no mundo, o Ginga é o middleware (camada de software intermediário) que permite o desenvolvimento de aplicações interativas para a TV Digital de forma independente da plataforma de hardware dos fabricantes de terminais de acesso. Esse é um avanço muito importante para a consolidação da linguagem do middleware da TV digital brasileira. Ao desenvolver suas soluções através de um middleware aberto e livre, a indústria nacional seguramente larga na frente dos demais países pela possibilidade de cooperação que se estabelece desde já.
O compartilhamento do conhecimento como mostra a experiência do software livre faz verdadeiras revoluções nessa área porque um conjunto muito grande de programadores voluntários de diferentes países pode contribuir para a melhoria dos códigos. Isso porque diferentes usuários em diferentes países podem copiar, estudar, alterar e distribuir o software já com as suas modificações tendo em vista que a licença é livre e independente de fornecedores. O exemplo do Software Público Brasileiro mostra que o compartilhamento de soluções é inexorável na humanidade e vamos ver muitas mudanças a médio e longo prazo nas regras de proteção de códigos e inclusive na proteção de obras autorais fechadas.
Esses são conceitos que estão por traz de uma das invenções mais fortes vivenciadas pela humanidade nos últimos anos - a Internet - que é uma aplicação muito radical do conceito de compartilhamento do conhecimento e uma das soluções de cooperação mais bem sucedidas no mundo atual. Qualquer que seja a sociedade no futuro, seja ela democrática e transparente ou mesmo autocrática, usará computadores. A diferença é que para ser verdadeiramente democrática, uma sociedade da informação precisa também abrir seus códigos na medida em que a implementação das leis cada vez mais depende de sistemas de informação para a sua aplicação.
Mas os grandes avanços virão do compartilhamento do conhecimento entre os quase oito mil membros que já fazem parte das comunidades do Portal do Software Público Brasileiro. O seu gerenciamento está sob responsabilidade da SLTI.
Data: 16 de julho de 2007 - 10h05
Autor: Coordenação Software Público
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